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NOTA DE REPÚDIO

Vimos, por meio dessa manifestação, demonstrar nosso repúdio à aprovação do PL 490/2007, nesta quarta-feira (23), na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), da Câmara das Deputados. O projeto pretende legalizar a "tese do marco temporal" e, com isso, inviabilizar a demarcação de terras indígenas no Brasil.


O texto aprovado é um ataque aos direitos constitucionais dos povos indígenas e abre brechas para a exploração predatória de suas terras, causando danos irreversíveis a estes povos e ao Meio Ambiente. A aprovação se torna ainda mais grave ao considerar que não houve participação popular, especialmente de representantes indígenas, no processo. Participação que poderia ter sido assegurada por meio de audiências públicas, por exemplo.


O PL 490/2007 também viola a Convenção 169 da OIT (Organização Mundial do Trabalho), que estabelece a necessidade de realização de consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas sobre medidas que afetam seus direitos, seu modo de vida e a sua cultura.


É igualmente condenável a violência policial desmedida contra as lideranças e mobilizações indígenas ocorridas em Brasília nesta semana contra o já citado PL 490/2007. A integralidade e segurança dessas populações devem ser resguardadas à luz das garantias constitucionais e na esteira da salvaguarda dos direitos humanos.


Desde o dia 8 de junho, mais de 800 indígenas de mais de 40 povos estão protestando em Brasília no Acampamento Levante pela Terra (ALT), mobilização contra as propostas legislativas que atacam diretamente direitos dos povos indígenas como os relativos a seus territórios, cultura e demarcação de terras. Depois de dois anos sem mobilizações presenciais, as lideranças se reuniram em Brasília para reforçar as denúncias acerca das violências em curso contra os direitos constitucionais garantidos aos povos indígenas do Brasil.


No dia 22 de junho, um grupo de indígenas protestava contra o PL 490/2007 quando foram reprimidos com violência pela Polícia Militar do Distrito Federal, com gases de efeito lacrimogêneo e moral, em frente ao Anexo 2 da Câmara de Deputados. Segundo relato das lideranças indígenas ali presentes, haviam crianças e anciãos que foram submetidos aos efeitos dessa repressão policial e tiveram que receber atendimento médico imediato, confirmando a falta de razoabilidade por parte das autoridades policiais.


Repudiamos profundamente o desconhecimento ou o não reconhecimento dos direitos dos povos originários. Trata-se do reflexo do racismo estrutural, da estrutura discriminatória profundamente enraizada que se manifesta na atual negligência e negação dos direitos dos povos indígenas na formação do Estado brasileiro, até os desdobramentos mais recentes associados às mudanças no cenário político.


É preocupante a intensificação da violência contra povos indígenas, resultado do aumento de atividades ilegais em suas terras, como exploração minerária, garimpo e extração de madeira; da construção de hidrelétricas, da expansão do agronegócio, dentre outras atividades empresariais que colocam em risco a própria existência dos povos indígenas.


Os episódios do dia 22 de junho e a aprovação do PL 490/2007 no âmbito da CCJ confirmam que os atuais interesses legislativos voltados para as temáticas socioambientais estão diretamente relacionados com a intensificação da violação de direitos dos povos originários, dos povos tradicionais e dos povos quilombolas que historicamente lutam pela garantia de suas existências.


Posicionar-se contra esse cenário é papel do poder público brasileiro, é papel das diferentes esferas que compõem o Estado Democrático de Direito em que estamos inseridos. Não cabe ao presidente da Câmara de Deputados, casa representativa da população, se colocar contra a participação legítima dos povos indígenas no debate de matérias que dizem respeito às suas vidas de maneira integral. O dever do poder público é de cumprir com normas, recomendações e precedentes no âmbito do direito internacional dos direitos humanos em defesa da vida.


Prestamos nossa solidariedade aos representantes dos diversos povos indígenas que foram vítimas da repressão policial enquanto exerciam o direito constitucional de se manifestarem frente aos contínuos retrocessos contra os povos indígenas, seus territórios e os direitos conquistados e respaldados pela Constituição Federal de 1988.


Trata-se de mais uma das lamentáveis ameaças ao direito à vida, ao direito à sua cultura, ancestralidade e autonomia para desenvolverem seus territórios de acordo com suas demandas, respeitando seus estilos de vida. Esse acontecimento representa mais uma das ações institucionais que revelam as profundas desigualdades que compõem o racismo estrutural brasileiro.


Sendo assim, reforçamos o nosso repúdio junto aos movimentos indígenas e organizações indigenistas e de direitos humanos contra as diversas violações dos direitos dos povos indígenas que levaram à necessidade do Levante pela Terra.


Nos solidarizamos aos povos indígenas e reafirmamos nosso compromisso em defesa de seus direitos, especialmente na tentativa de barrar o avanço desta pauta no Congresso Nacional.


Subscrevem:


  • Conectas Direitos Humanos

  • APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil)

  • ISA (Instituto Socioambiental)

  • IBAP (Instituto Brasileiro de Advocacia Pública) *


* Cf. Deliberação unânime de diretoria de 24.06.2021




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